Anastasia: entrevista com os compositores do musical da Broadway
A trilha sonora do musical Anastasia é fascinante. Não é à toa que a dupla que compôs as músicas do espetáculo da Broadway, Stephen Flaherty e Lynn Ahrens, foi nominada ao Oscar pelas canções da animação homônima da FOX de 1997 e pela música “Journey to the Past”. Em uma entrevista exclusiva ao WePlann, os compositores de Anastasia nos contaram um pouco sobre suas trajetórias e sobre a criação de músicas para shows da Broadway.
Stephen Flaherty é compositor e escreve as músicas para piano, bem como as melodias para todas as vozes. “Eu sempre escrevi músicas e contei histórias por meio delas. Acho que sempre fui um dramaturgo cuja primeira linguagem era a música”, disse Stephen. Ele começou a tocar piano aos 7 anos e escreveu seu primeiro musical aos 14!
A letrista Lynn Ahrens, por sua vez, começou sua carreira escrevendo texto de anúncios, o que a levou a escrever músicas para comerciais infantis e jingles. Após fazer uma oficina de teatro musical, ela conheceu Stephen. “Nós começamos a trabalhar juntos em 1983 e não paramos mais!”, disse Lynn.
Stephen e Lynn venceram diversos prêmios, inclusive um Tony Award, e têm trabalhado há mais de 30 anos juntos escrevendo canções para teatro musical. Eles atualmente têm dois musicais em cartaz na Broadway: Anastasia e Once On This Island.
Das 25 faixas do álbum de Anastasia, apenas cinco foram adaptadas do filme animado para o palco. Uma vez que um novo enredo foi desenvolvido, novas músicas foram escritas e as antigas foram repensadas. “A alegria de escrever um novo musical é escrever as músicas novas!”, disse Stephen. Confira a música “In a Crowd of Thousands”, uma das novas composições para a versão teatral da história:
“É isso que as pessoas amam em Anastasia – todas as emoções.” – Stephen Flaherty
Qual é o processo de adaptar músicas e criar músicas novas para uma história que já existia, como Anastasia?
STEPHEN: Nós geralmente sabemos a história com antecedência, ou pelo menos temos uma ideia de como ela vai ser. Nós trabalhamos lado a lado com Terrence McNally (autor) desde o primeiro dia, falando sobre a história, tema, enredo e ajudando a dar forma à nova versão do material do filme. Uma vez que fizemos isso, Lynn e eu começamos a compor as novas músicas e adaptar as músicas do filme. Ser um compositor de teatro significa que a história e o personagem sempre vem primeiro. Uma vez que havíamos criado um primeiro esboço da trilha sonora e script, nós convidamos nosso diretor, Darko Tresjnak para entrar na equipe. Darko tinha muitas ideais visuais, bem como ideias dramatúrgicas. Ele era o colaborador ideal. Cena por cena e música por música, o musical cresce.
Quais são os desafios de escrever canções para um musical da Broadway?
STEPHEN: Você deve se lembrar de que o público vai ouvi-las em tempo real, então você precisa ser muito claro nas suas intenções. Em outras palavras, um público ao vivo não pode “rebobinar” para ouvir a passagem novamente! Nós queremos que você sinta algo no teatro, seja alegria, risos ou lágrimas. O objetivo de todo compositor é criar músicas que soem verdadeiras para o personagem que as está cantando. O desafio é encontrar o equilíbrio entre o que o personagem quer dizer e o que o público quer ouvir. É isso que as pessoas amam em Anastasia – todas as emoções.
E qual foi o maior desafio de Anastasia?
STEPHEN: Ser fiel e proteger não apenas os personagens que as pessoas amam (e com os quais muitos cresceram) mas também da história e cultura russa. A adaptação teatral é muito mais verdadeira que a versão da animação cinematográfica. No entanto, o maior desafio com Anastasia foi saber quando parar de escrever! Nós podíamos ter escrito mais dez músicas!
Como vocês apresentam uma música para os atores pela primeira vez? Como acontece o primeiro ensaio?
STEPHEN: Quando nós sabemos que uma canção vai estar no show, nós geralmente trabalhamos em conjunto com o diretor de música (ou maestro) para ensiná-la. Nós apresentamos algumas das canções principais aos atores quando eles fazem uma audição para a produção. As candidatas a Anya cantaram várias das músicas produzidas para Anya, por exemplo. Nós começamos a formar vários pares de Anyas e Dmitrys para callbacks. Foi tão empolgante ver nossos personagens em três dimensões pela primeira vez!
Para o primeiro ensaio nós geralmente fazemos uma leitura na qual os atores leem as cenas e os compositores cantam a maior parte do material. E os compositores não são cantores profissionais! Então dali pra frente só melhora!
Se é um solo para uma estrela, eles têm um tempo a sós conosco para aprender antes de cantarem para os outros, e nós conversamos com eles sobre o porquê de termos escrito a música para o personagem que eles estão interpretando e o que ela significa. Se é um número de grupo, todos sentam em uma sala de ensaio com suportes para partitura e são ensinados em grupo pelo diretor de música. Nós ficamos de lado para responder perguntas. Uma vez que todas as músicas foram ensinadas, o diretor começa a ensinar a encenação e coreografia.
A música é conectada aos sentimentos na sua essência. O que você faz para entrar em contato com o sentimento que você quer transmitir com as músicas que você compõe?
STEPHEN: Eu me coloco na pele do personagem. É como um “método de interpretação para o ator”, mas ao contrário. Uma vez que eu estou imerso na sensação que o personagem está tendo na cena, naquele momento específico, a música surge naturalmente. Eu também crio olhando para fotografias, pinturas e outros atributos visuais que me dão “pistas” de como o mundo deveria ser e a sua sensação. Eu então traduzo esse sentimento em som. Eu sei: a música é misteriosa.
Como você se sente depois de ver a música sendo interpretada ao vivo pelos atores e a orquestra?
STEPHEN: Eu me sinto a pessoa mais sortuda do mundo. Como se eu estivesse flutuando em uma nuvem.
LYNN: É uma sensação incrível ouvir os atores pegarem as músicas para si (especialmente porque eles sempre cantam melhor que o Stephen e eu!). O melhor dia de ensaio é o ensaio especial chamado sitzprobe, quando os atores cantam cara a cara com a orquestra e todas as músicas ficam completas. Normalmente todo mundo fica em prantos, é emocionante! Foi um dia maravilhoso em Anastasia!
Como foi sua pesquisa para aprender sobre os personagens e a história de Anastasia para escrever as músicas?
STEPHEN: Eu escutei muitas músicas de Coral Russo e folk, bem como ballet e música sinfônica, estudando as cores e caráter das músicas. O Segundo Ato se passa na Era do Jazz em Paris, um mundo completamente novo com uma sonoridade mais moderna. Essa parte também foi bem divertida.
LYNN: Eu li incontáveis livros – a história da família Romanov, a impostora que na vida real tentou convencer a realeza de que ela era a princesa perdida, a história da Revolução Russa, etc. Tudo que você lê te dá ideias para especificidades nas músicas – coisas que fazem as músicas e os personagens ganharem vida. Há uma música em Anastasia chamada “My Petersburg” (Minha Petersburgo), que surgiu da minha pesquisa sobre a cidade.
“Eu também crio olhando para fotografias, pinturas e outros atributos visuais que me dão “pistas” de como o mundo deveria ser e a sua sensação. Eu então traduzo esse sentimento em som. Eu sei: a música é misteriosa.” – Stephen Flaherty
Como você entra em contato com o personagem quando você cria as letras? Como você faz para saber o que cada personagem diria?
LYNN: Essa é uma ótima pergunta. Escrever para personagens é um processo muito intuitivo. Eu tento entender tudo que eu posso sobre eles – qual é seu nível de educação, como eles vivem, que tipo de trabalho eles fazem, quais são seus problemas. Eu escuto como eles falam em suas cenas e o tipo de linguagem que usam. Eles são de classe alta ou são pobres? Eles têm sotaque? Usam gírias? Aos poucos, eu começo a sentir o personagem e suas palavras começam a surgir para mim de forma natural. O objetivo é sempre fazer com que os personagens soem como eles mesmo, não como eu. Muitas vezes, Stephen escreve um pouco da música primeiro, o que sempre me dá ideias.
Você tem um método específico para criar as rimas? Quais técnicas você usa na sua escrita?
LYNN: Eu sempre tento usar “rimas ricas” (não rimar “mine” com “time”, por exemplo, que é pobre). E a não ser que um personagem seja muito sagaz e culto, eu tento não rimar demais. Eu quero que as rimas soem como uma fala normal, mesmo que não seja. Algo que enriquece qualquer tipo de escrita é o uso de imagens. É por isso que “Once Upon A December” é uma música tão famosa, por exemplo. Você pode fechar seus olhos e ouvi-la que as imagens vão preencher sua cabeça. É sempre bom para um escritor realmente olhar para o mundo e tentar descrevê-lo com uma linguagem colorida e vívida.
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Escrito por Natália Grandi, jornalista e tradutora que ama conhecer novas culturas e viajar, seja com os livros ou com a mochila nas costas. É criadora de Conteúdo no WePlann.